terça-feira, junho 06, 2006

Valium

Não se pode falar mal do futebol agora.

Para os adeptos seria uma verdadeira traição, pois as Quinas vão defender nada mais nada menos que a honra da Nação.

Para quem não gosta de futebol seria como disparar contra a Cruz Vermelha: demasiado fácil.

Pessoalmente gosto de futebol, até cheguei a escolher uma equipa portuguesa para a qual torcer; e, com certeza, irei assistir a muitos dos encontros do Mundial transmitidos pela televisão. Mas isso não significa automaticamente a hibernação da actividade cerebral. E por isso julgo que tudo aquilo que se está a passar atinge picos de idiotice abismal.

Hoje à noite a maioria dos telejornais dedicaram amplo espaço à chegada da Selecção à Alemanha. A pergunta é a seguinte: onde está a notícia? Dado que os Mundiais são disputados naquele país parece-me bastante normal o facto de lá ir.
A notícia, eventualmente, poderia ter sido a falta da chegada. Ou a viagem para outro lugar.

Sempre hoje, em directo, o treino dos nossos heróis. Note-se: não um jogo, mas mesmo o treino. E aqui já entro em confusão. Percebo (?) a identificação dos valores portugueses com os resultados da Selecção ao longo da próxima competição; percebo (?) que uma eventual vitória seria tão benéfica para o País; e percebo (desta vez sem dúvidas) o amor pelo jogo.

Mas não consigo entender qual o gozo em ver o vendedor de relógios treinar um rapaz ainda com as gotas de leite nos cantos da boca mas cujo dinheiro parece dar-lhe o direito de agredir os adversários em campo.

Que vamos fazer? Como definir esta capa de valium que está a cobrir Portugal? Ligamos para um sociólogo?

Não é preciso, pois a explicação está escrita em latim: “panem et circenses”. Com uma certa liberdade podemos traduzir com “barriga cheia e diversão”, uma óptima receita para que o povo não fique demasiado ocupado com os problemas reais do País. Os Romanos lá chegaram há 2.000 anos.
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